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Perito da ONU apela a um financiamento internacional para o desenvolvimento baseado nos direitos humanos

27 maio 2015

A Terceira Conferência Internacional sobre Financiamento para o Desenvolvimento deve endossar e reforçar uma abordagem ao desenvolvimento baseada nos direitos humanos, declarou ontem Juan Pablo Bohoslavsky, Perito Independente das Nações Unidas sobre os efeitos da dívida externa e os direitos humanos. O perito instou os governos de todo o mundo a disponibilizarem os recursos necessários para garantir que os futuros objectivos internacionais de desenvolvimento possam ser realisticamente atingidos. 

Este apelo surge no momento em que os Estados negoceiam o documento final da Terceira Conferência Internacional sobre Financiamento para o Desenvolvimento, que terá lugar em Addis Ababa, Etiópia, de 13 a 16 de Julho de 2015.

“Os direitos humanos têm de estar no centro do financiamento para o desenvolvimento a fim de garantir que todos possam gozar uma vida decente, sem fome e com acesso à educação, cuidados de saúde, habitação e água potável”, afirmou Juan Pablo Bohoslavsky. “Esta Conferência deve reiterar que o ser humano é o sujeito central do desenvolvimento, devendo participar activamente no mesmo e dele beneficiar.”

O perito instou os negociadores a reconhecerem no documento final da Conferência que serviços de dívida insustentáveis continuam a colocar desafios ao desenvolvimento sustentável e à realização dos direitos económicos, sociais e culturais. “Embora o perdão internacional da dívida tenha sido importante para os países pobres altamente endividados, a maioria deles não deverá alcançar os Objectivos de Desenvolvimento do Milénio até ao final deste ano”, disse.

“Infelizmente, alguns destes países estão, mais uma vez, em risco de cair na armadilha da dívida”, advertiu o Perito Independente. “É preciso que este falhanço não se repita e são necessárias soluções de longo prazo para o problema global da dívida insustentável, incluindo para países de rendimento médio e altamente desenvolvidos.”

 Juan Pablo Bohoslavsky observou que a finança privada e as empresas podem dar uma importante contribuição para um desenvolvimento sustentável; contudo, sublinhou que “a conferência deve reiterar que os Estados têm de garantir que todos os investimentos respeitam as normas sociais, ambientais e de direitos humanos pertinentes, incluindo os Princípios Orientadores sobre Empresas e Direitos Humanos e os Princípios Orientadores sobre Dívida Externa e Direitos Humanos.”

“Os projectos de infra-estruturas financiados por empréstimos para fins de desenvolvimento levaram à deslocação de milhões de pessoas em todo o mundo na última década e afectaram indivíduos que nem sempre receberam uma indemnização adequada”, disse, manifestando-se preocupado com o facto de os procedimentos de salvaguarda ambiental e social dos bancos de desenvolvimento não terem sido suficientemente robustos para prevenir violações de direitos humanos.

Juan Pablo Bohoslavsky considerou também que as referências à igualdade constantes do documento final não devem limitar-se exclusivamente à igualdade de género. “As normas internacionais de direitos humanos obrigam os Estados a garantirem a igualdade e não discriminação em toda a sociedade, nomeadamente em relação às pessoas com deficiência, crianças, membros de minorias e outros grupos em risco de exclusão social”, disse.

“Um maior ênfase da Conferência no combate aos fluxos financeiros ilícitos, evasão fiscal e fraude fiscal será fundamental para garantir que os Estados conseguem respeitar o compromisso assumido de afectar os recursos disponíveis, na máxima medida possível, à realização dos direitos económicos, sociais e culturais”, afirmou o Perito Independente.

“Porém”, avisou, “no actual projecto faltam compromissos mais claros quanto à eliminação do sigilo bancário, protecção dos jornalistas e denunciantes de corrupção ou evasão fiscal contra represálias e metas mensuráveis para a redução dos fluxos financeiros ilícitos.”

O perito reconheceu que o projecto de documento final apela a uma reestruturação justa, eficaz e atempada da dívida pública com base no princípio da partilha de responsabilidades, mas lembrou aos negociadores que “os processos de reestruturação da dívida devem também garantir que os Estados possam cumprir as suas obrigações de direitos humanos.”

O Perito Independente recomendou que a Conferência apoie o trabalho da UNCTAD sobre os exercícios da dívida soberana e os Princípios Orientadores das Nações Unidas sobre Dívida Externa e Direitos Humanos.

“É necessário conciliar obrigações por vezes conflituantes dos Estados: o reembolso da dívida e o respeito dos direitos humanos”, declarou Juan Pablo Bohoslavsky. “O direito internacional tem as ferramentas disponíveis para levar a cabo esta delicada tarefa e deve ser-lhes prestada mais atenção.”

“Espero que a Conferência trate também do problema dos fundos-abutres”, disse. “Não deve permitir-se que certos fundos de alto risco comprometam soluções para as crises da dívida soberana em detrimento dos credores cooperativos e das pessoas que vivem nos países afectados.”

“Endosso também as sugestões apresentadas pelo Alto Comissariado das Nações Unidas para os Direitos Humanos a fim de tornar a declaração final da conferência mais compatível com as normas e padrões internacionais de direitos humanos”, concluiu o perito.


Autor: Raquel Tavares

Fontewww.ohchr.org