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TEDH, 3ª Secção, Voynov c. Rússia, Acórdão de 3 de julho de 2018

10 jul 2018

CEDH, Artigo 13.º + 8.º, Existência de recurso efetivo de uma decisão processual penal de colocação de condenado em centro de detenção muito afastado da área da residência familiar.

CEDH, artigo 8.º, Interferência de uma decisão de colocação de condenado em cumprimento de pena em lugar de execução muito afastado da área da residência familiar no direito à vida privada e familiar do condenado em cumprimento de pena.


Timur Vladislavovich Voynov queixou-se ao Tribunal Europeu dos Direitos Humanos (TEDH) em 2011, de que o seu direito à vida privada e familiar fora violado pela decisão das autoridades russas de o colocar em centro de detenção para cumprimento de pena, em que fora condenado, muito afastado da área de residência da sua família. Queixou-se da falta de recursos judiciais disponíveis para pôr termo à violação do seu direito à vida privada e familiar (CEDH, art.º 13.º + 8.º) e da violação do seu direito à vida privada e familiar (CEDH, art.º 8.º).

Com efeito, o queixoso e a sua família viviam em Oryol, quando ele foi condenado por crimes relacionados com drogas. Passou a cumprir a pena em que foi condenado na região de Krasnoyarsk, muito afastada de Oryol. Mais concretamente, foi colocado para cumprimento de pena no estabelecimento penitenciário da vila de Areyskoye, na região de Krasnoyarsk, a cerca de 4.200 km de distância de Oryol.

O queixoso pediu recorrentemente a sua transferência para estabelecimento penitenciário próximo de Oryol. Os seus pedidos foram sempre recusados com fundamento na falta de razões válidas para ser efetuada a transferência. Apenas conseguiu ver a família em duas ocasiões. Entretanto, a esposa deu à luz uma filha do casal.

A referência jurisprudencial para este caso é o acórdão proferido pelo TEDH no caso Polyakova e outros c. Rússia, de Março de 2017. Numa situação semelhante, a Rússia foi condenada pelas mesmas violações com o mesmo fundamento.

Decidindo sobre a admissibilidade, o TEDH deixou a invocação da ausência de esgotamento dos recursos internos disponíveis para o mérito, por se prender esta invocação do Governo com a invocação do Requerente, de que não dispunha de recurso adequado efetivo e suficiente para remediar a violação.

Quanto ao fundo da causa, o TEDH, como referido, já tem experiência deste tipo de questões noutros casos. Com efeito, o artigo 25.º do CPP russo permite a manutenção da proximidade do recluso preventivo, da sua família, mas já não opera no caso do recluso condenado por meio de uma decisão definitiva, uma vez que existe uma lei sobre a alocação dos lugares disponíveis em estabelecimentos penitenciários, cujo efeito é o de enviar para longe os reclusos condenados em sentença com carácter definitivo, que se encontram em cumprimento de pena.

Da experiência do TEDH resulta que nunca um condenado em execução de pena beneficiou do processo que lhe abre o artigo 25.º do CPP. Por outro lado, Voynov trouxe um feixe de factos e de argumentos que fornecem um começo de prova em seu benefício (na linguagem do TEDH, uma prova prima facie) que o Governo não logrou desfazer para além de toda a dúvida razoável.

Uma vez que a solução do artigo 25.º do CPP nunca funcionou para um condenado por sentença definitiva, Voynov, que não se socorreu da disposição do artigo 25.º do CPP para operar os seus pedidos, não a tinha de esgotar, uma vez que este meio tem-se revelado inefectivo. Verificou-se assim a violação das disposições combinadas dos artigos 13.º e 8.º da CEDH: Voynov não dispunha de um recurso adequado, disponível e efetivo.

Quanto ao artigo 8.º, direito à vida privada e familiar de Voynov, o TEDH entendeu que apesar da pena de prisão se destinar a provocar um desconforto na vida do recluso – é uma pena – este desconforto não deve ser tal que resultem enfraquecidos os laços da vida familiar deste.

O TEDH, mais uma vez, já entendeu que a lei russa não resolve este problema, em outras situações. Tomou nota de que a situação na Rússia não evoluiu desde Polyakova. Houve assim, para o Tribunal europeu, a violação do artigo 8.º da CEDH, do direito à vida privada e familiar de Voynov.

Concedeu 6000€ pelo dano moral a Voynov acrescidos de 850€ de custas e despesas com a queixa ao TEDH.

O Acórdão foi adotado por unanimidade.

No seu voto concordante a Juíza Eloseguy especifica mais pormenorizadamente os elementos do teste de proporcionalidade de uma medida (a sua necessidade numa sociedade democrática), entre a adequação da medida ao caso, a sua necessidade concreta, e a sua concreta proporcionalidade num sentido mais restrito.

Aplicando estes critérios chega à conclusão de que as autoridades russas podiam ter alcançado o fim da punição do condenado, escolhendo uma prisão mais próxima da sede familiar, e por isso se verificou a violação do artigo 13.º + 8.º CEDH e 8.º, concordando assim com o julgamento da Seção. 


Autor: Paulo Marrecas Ferreira  

Fonte: Tribunal europeu dos direitos humanos