Simp

Está aqui

TEDH, 4.ª S., Vyshnyakov c. Ucrânia, Acórdão de 24 de julho de 2018

10 set 2018

CEDH, Artigo 8.º, Não execução de uma sentença de regulação da guarda de uma criança. Violação.

Artigo 14 + 8.º Discriminação em razão do género invocada por o Requerente que sofreu com a inexecução da sentença, o pai, ser do género masculino. Não violação.


Vyshnyakov apresentou queixa contra a Ucrânia em 2012 pela não execução de uma sentença do tribunal interno que lhe concedeu acesso à sua filha menor. Outro processo em que se procurou opor à mudança de domicílio pela mãe, tendo este pedido sido rejeitado, fundamentou a sua queixa por discriminação de género, entendendo que a fixação de domicílio da criança, então pedida, fora rejeitada por ser homem.

O casal casara em 2006, a sua filha nasceu em 2007. Pouco depois, os pais separaram-se, em 2009 obtiveram o divórcio. Nesta decisão o Tribunal de Mykolayiv concedeu ao pai o direito de visitas. A mãe sempre se opôs, vindo entretanto a mudar-se com a filha para uma localidade distante de 600 quilómetros, o que motivou da parte de Vyshnyakov um novo processo em que este pediu que o domicílio da filha viesse a ser o do pai, o que o tribunal rejeitou.

Entretanto Vyshnyakov propôs uma ação de execução de sentença, a sentença que atribuía a ambos os progenitores um direito de contato e de convivência com a criança, mas, apesar de uma decisão favorável à execução, da parte da primeira instância, esta decisão acabou em recurso por ser revogada por inexistir um quadro regulatório processual bastante para suportar uma ação executiva desta natureza. Vyshniakov voltou a insistir junto do tribunal e obteve a comparência de agentes de execução, que se limitaram a ler à mãe a sentença de regulação da guarda parental, e entenderam satisfeita a ação executiva. Vyshnyakov, inconformado, voltou a propor uma ação executiva mas o tribunal entendeu estar correto o comportamento dos agentes de execução e rejeitou esta ação por improcedente.

O Requerente queixou-se à luz dos artigos 6.º e 13.º da iniquidade do processo, queixou-se, à luz dos artigos 14.º e 8.º, de discriminação de género, pediu compensações à luz do artigo 41.º e pediu que o TEDH se pronunciasse em matéria de execução de acórdãos (do próprio TEDH), ao abrigo do art.º 46.º da CEDH.

O TEDH considerou a queixa admissível e requalificou a queixa à luz dos artigos 6.º e 13.º combinados, como relevando do artigo 8.º. Neste ponto, o TEDH entendeu que o gozo pelos pais e pelos filhos da presença mútua, é um elemento essencial da vida familiar para o efeito do artigo 8.º da CEDH. É dever do Estado permitir este relacionamento e evitar que alguém o possa prejudicar. O queixoso mostrou às autoridades nacionais o prejuízo sério no relacionamento com a filha, que estava a ser provocado. O TEDH não concordou com a visão das autoridades, de que o processo executivo estaria encerrado com a simples leitura da sentença de distribuição da guarda parental à mãe. Tal não foi bastante para assegurar a execução desta sentença.  Nomeadamente, a ausência de medidas de coação impostas à mãe diminuiu a cooperação desta. Por seu turno, a inexistência de um quadro regulatório preciso ajudou ao incumprimento da decisão judicial. Houve assim, a violação do artigo 8.º § 1 da CEDH.

Quanto à violação alegada do princípio da não discriminação de género associada ao direito à vida privada e familiar, o TEDH requalificou-a sob o ângulo exclusivo do art.º 8.º. E entendeu que por ser a criança pequena e habituada a viver com a mãe, não houve violação deste preceito na recusa pelo tribunal em atribuir o domicílio da criança ao pai, como este pedira.

Em sede do art.º 46.º o TEDH entendeu que a execução do seu Acórdão estaria cumprida com a supervisão pelo CM do cumprimento deste Acórdão pelas autoridades nacionais. Por fim atribuiu ao pai uma indemnização pelo dano moral, bem como um montante ao título das custas e despesas que o processo de queixa junto do TEDH causou ao Requerente. O Acórdão foi votado por unanimidade.


Autor: Paulo Marrecas Ferreira

Fonte: Tribunal Europeu dos Direitos Humanos