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TEDH, 4ª Secção, Szurovecz c. Hungria, Acórdão de 8 de outubro de 2019

21 out 2019

CEDH, Artigo 10.º, direito à liberdade de expressão na vertente da recolha e da partilha de informação. Requerimento da parte de um jornalista de acesso a um campo de acolhimento de requerentes de asilo. Negação do acesso, Não possibilidade de impugnação judicial da negação. Direito à liberdade de expressão na vertente de recolher e partilhar informação. Violação.

Szurovecz um jornalista húngaro, procurou aceder a vários campos de acolhimento de requerentes de asilo na Hungria e foi-lhe sempre negado o acesso. Requereu, por último, o acesso ao campo de acolhimento de requerentes de asilo de Debrecev, tendo invocado a crise dos refugiados e os relatórios das organizações internacionais, como as Nações Unidas, que se mostravam críticos da gestão da crise da parte das autoridades húngaras. Mais uma vez, o acesso foi-lhe negado. Impugnou então, o acto administrativo de recusa de acesso diante do tribunal administrativo, impugnação cuja possibilidade lhe foi negada mediante a afirmação de que o acto de recusa de acesso não configurava um acto administrativo e, por isso, não era suscetível de impugnação judicial. Um Deputado conseguiu o acesso a este campo e Szurovecz pôde redigir o seu artigo com base no relato do Deputado. Entretanto Szurovecz queixou-se ao TEDH por violação do seu direito à liberdade de expressão (art.º 10.º da CEDH) e por indisponibilidade de um recurso efetivo desta violação. 

Na medida em que certas objeções do Governo à admissibilidade da queixa eram relativas à questão de saber se havia ou não violação do direito à liberdade de expressão, o TEDH juntou estas objeções ao exame do fundo e admitiu a queixa de Szurovecz.

No processo registou-se a intervenção de terceiros de OINGs internacionais em abono da posição de Szurovecz. Para estas OINGs o direito de acesso aos campos de acolhimento era elemento caracterizador da liberdade de expressão, uma vez que, sem este acesso, não existia a possibilidade do conhecimento direto da situação para o efeito da partilha da informação correspondente.

O TEDH observou que houve uma interferência no direito ao acesso à informação, o qual direito é elemento essencial da liberdade de expressão. Colocou a questão de saber se a interferência estava prescrita na lei e se prosseguia um fim legítimo. Descobriu um decreto do Governo, de limitação do acesso destes campos a jornalistas, e entendeu ser tal suficiente como base legal para a conduta das autoridades, no sentido de recusarem conceder o acesso. Admitiu que o fim desta medida era legítimo, aceitando que esta medida se destinava a proteger a vida privada e familiar dos requerentes de asilo. Colocou, a seguir, a questão de saber se a medida era necessária numa sociedade democrática, indicando como jurisprudência de referência, o seu Acórdão proferido na queixa Bédat c. Suiça. O TEDH notou que o artigo que o jornalista pretendia redigir se destinava a cobrir a situação dos requerentes de asilo; observou que esta atividade se enquadrava na crise dos refugiados, e verificou que o ACNUR é muito crítico em relação à Hungria, no que respeita à denúncia da violação das disposições legais contidas nos seus instrumentos, em particular no PIDCP.

O TEDH acentuou, ainda, a função de cão de guarda da imprensa em relação a eventuais abusos cometidos pelas instituições e concluiu que as autoridades não prestaram a suficiente atenção a esta dimensão do problema. O TEDH procedeu, ainda, à análise dos instrumentos internacionais, do direito internacional, e do direito comparado, e embora tenha chegado à conclusão que a conduta das autoridades se destinava à proteção do direito à vida privada e familiar dos requerentes de asilo, a negação do acesso representava uma solução demasiado restritiva, tanto mais que o jornalista se havia comprometido expressamente a não capturar imagens sem o consentimento dos respetivos titulares na pessoa dos requerentes de asilo de modo a não criar nenhum estigma na sua pessoa.

Louvando-se, assim, no direito ao acesso à informação para o exercício do direito à partilha da informação enquanto elementos caracterizadores do direito à liberdade de expressão e no facto de que o jornalista se havia previamente comprometido, de modo expresso, a não capturar nenhuma imagem destes requerentes de asilo no seio do campo de acolhimento de modo a não criar nenhum estigma na sua pessoa, o TEDH concluiu pela violação do direito à liberdade de expressão vertido no artigo 10.º § 1 da CEDH. Entendeu, ainda, ser o segmento da queixa relativo à alegada violação do artigo 13.º admissível. Este segmento de queixa foi, no entanto, segundo o TEDH, consumado pela conclusão a que chegou relativamente ao artigo 10.º e, por isso, não foi analisada a sua violação no plano do mérito. 


Autor: Paulo Marrecas Ferreira

Fonte: Tribunal Europeu dos Direitos Humanos