Esta Convenção, adotada a 20 de dezembro de 2006 e entrada em vigor na ordem internacional a 23 de dezembro de 2010, define desaparecimento forçado como: “a prisão, a detenção, o sequestro ou qualquer outra forma de privação de liberdade por agentes do Estado ou por pessoas ou grupos de pessoas agindo com a autorização, o apoio ou o consentimento do Estado, seguido da recusa em reconhecer a privação de liberdade, ou do encobrimento do destino ou do paradeiro da pessoa desaparecida, colocando-a assim fora do âmbito de proteção da lei” (art.º 2.º).
É considerada vítima de um desaparecimento forçado “a pessoa desaparecida e qualquer indivíduo que tenha sido lesado em consequência direta de um desaparecimento forçado” (art.º 24.º, n.º 1).
O texto contém várias disposições semelhantes às da Convenção contra a Tortura, nomeadamente:
Proibição dos desaparecimentos forçados em todas as circunstâncias (artigo 1.º, n.º 2);
Obrigação de investigar os casos de alegado desaparecimento (artigos 3.º e 12.º, n.º 3), mesmo na ausência de queixa formal (artigo 12.º, n.º 2);
Obrigação de criminalizar tais práticas (artigo 4.º) e de as punir com penas adequadas à sua gravidade (artigo 7.º);
Proibição da invocação de ordens superiores para justificar um desaparecimento forçado (artigo 6.º, n.º 2);
Obrigação de punir os superiores que ordenem um desaparecimento forçado ou o tolerem (artigo 6.º, n.º 1);
Proibição da punição de alguém por se ter recusado a cumprir ordens com vista à prática de um desaparecimento forçado (artigo 23.º, n.º 2);
Obrigação de deter os suspeitos que se encontrem no território do Estado Parte e de instaurar um inquérito preliminar (artigo 10.º);
Obrigação de julgar o suspeito ou de o extraditar para julgamento em outro país (artigos 9.º e 11.º);
Proibição de extradição ou entrega a um país caso existam motivos para crer que a pessoa pode aí ser sujeita a desaparecimento forçado – princípio do non refoulement (artigo 16.º);
Direito de queixa de qualquer pessoa que tenha conhecimento da ocorrência de um desaparecimento forçado (artigo 12.º);
Obrigação de denúncia dos funcionários responsáveis pela aplicação da lei no mesmo caso (artigo 23.º, n.º 3);
Direito das vítimas a indemnização e medidas de reparação (artigo 24.º, nºs 4 e 5);
Consideração da prática dos desaparecimentos forçados como um crime suscetível de dar lugar a extradição (artigo 13.º);
Prestação de assistência mútua na investigação dos casos e na assistência e localização das vítimas (artigos 14.º, 15.º e 25.º, n.º 3);
Formação adequada do pessoal responsável pela aplicação da lei (artigo 23.º);
Proteção dos denunciantes e testemunhas (artigos 12.º, n.º 4 e 18.º, n.º 2).
Porém, nesta Convenção encontramos também disposições originais, designadamente as que visam prevenir a ocorrência dos desaparecimentos forçados e que se encontram plasmadas, por exemplo, nos artigos 17.º, 18.º e 21.º:
Proibição da detenção secreta;
Definição das condições e autoridades competentes para a emissão das ordens de privação de liberdade;
Obrigação de manter os reclusos unicamente em locais de detenção oficialmente reconhecidos e supervisionados;
Autorização de contactos e visitas da família, amigos, advogado e autoridades consulares;
Inspeção dos locais de privação de liberdade;
Obrigação de manutenção de registos completos da detenção e especificação dos elementos que os mesmos deverão conter;
Garantia de acesso aos registos das pessoas com interesse legítimo;
Direito de recurso contra a privação de liberdade ou contra a negação de acesso aos registos (artigo 20.º, n.º 2);
Libertação do recluso de forma que permita verificar que tal libertação ocorreu de facto (artigo 21.º).
A Convenção consagra um direito absolutamente inovador: o “direito de saber a verdade quanto às circunstâncias do desaparecimento forçado, a marcha e os resultados do inquérito e o destino da pessoa desaparecida” – direito à verdade (artigo 24.º, n.º 2). Obriga também à prevenção e punição dos atos de entrave ou obstrução dos recursos e investigações, omissão de registo, recusa de informação e fornecimento de informação inexata (artigos 22.º e 12.º, n.º 4) e à proteção dos dados pessoais dos detidos e pessoas desaparecidas (artigos 19.º e 20.º). A prescrição só poderá ter lugar após um prazo longo que comece a contar a partir do momento em que cessa a situação de desaparecimento (artigo 8.º). Deverão também ser tomadas providências quanto à situação jurídica das pessoas desaparecidas e seus familiares (artigo 24.º, n.º 6), por exemplo nos domínios da proteção social, das questões financeiras, do direito da família e dos direitos de propriedade.
Quanto às crianças, os Estados Partes ficam obrigados a prevenir e punir a subtração indevida de crianças sujeitas a desaparecimento forçado, crianças cujos pais ou tutores estejam desaparecidos ou crianças nascidas durante o período de desaparecimento forçado das suas mães (artigo 25.º, n.º 1), assim como a falsificação, destruição ou ocultação dos documentos de identificação destas crianças (artigo 25.º, n.º 1, alínea b)). Têm também de tomar as medidas necessárias para procurar e identificar as crianças desaparecidas e fazê-las regressar às suas famílias de origem (artigo 25.º, n.º 2). Em caso de adoção ou internamento de uma criança com origem num desaparecimento forçado, há que rever o processo e, se necessário, anulá-lo (artigo 25.º, n.º 4).
Tal como os restantes principais tratados de direitos humanos da ONU, também esta Convenção dispõe de um comité de peritos independentes responsáveis pelo controlo da aplicação das suas disposições pelos respetivos Estados Partes: o Comité contra os Desaparecimentos Forçados.