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TEDH, 5ª Secção, Robert c. França, Decisão de inadmissibilidade de 26 de setembro de 2019

7 out 2019

CEDH, Artigo 7.º, Nullum crimen, nulla poena sine lege, 6.º iniquidade processual, 3.º maus tratos. Condenação por vários crimes de terrorismo em Marrocos. Transferência para França ao abrigo da Convenção relativa à transferência de pessoas condenadas vigente entre os dois países, a questão da adaptação da pena versus a substituição da sentença penal.

Robert , um cidadão francês, foi constituído arguido e, posteriormente, condenado em Marrocos pela prática de terrorismo, a qual se materializou no cometimento de vários crimes porque veio a ser condenado na pena de prisão perpétua. Requereu a sua transferência para França, ao abrigo da Convenção franco-marroquina relativa à transferência de pessoas condenadas, pedido que foi satisfeito e, uma vez em França, pediu a adaptação da sua pena ao Direito francês, entendendo, no seu requerimento, que o direito a aplicar seria o direito francês vigente ao tempo do cometimento dos crimes porque fora condenado, e não o direito francês vigente no momento da efetivação da sua transferência.

A justiça francesa, numa sentença do Tribunal de Paris, não entendeu assim. Aplicou a Robert o direito francês aplicável no momento da concretização da transferência, o que significou a adaptação da sua pena criminal e não a revisão da sentença inicial, ou a elaboração de nova sentença criminal de substituição da primeira. E reduziu a pena perpétua marroquina para o máximo aplicável em França, ou seja, trinta anos, dos quais deduziu o tempo de execução de pena já cumprido em Marrocos.

Robert não se conformou, esgotou os recursos disponíveis e perdeu, vindo a queixar-se ao TEDH. Entendendo que a não substituição da sentença do Tribunal criminal de Rabat equivalia a uma aplicação de pena sem crime, porque sem condenação, e por isso, sem fundamento legal, invocou o artigo 7.º da CEDH, nullum crimen, nulla poena sine lege. Acrescentou a consideração de que o processo de adaptação da pena teria sido iníquo, artigo 6.º e entendeu que este conjunto circunstancial equivalia a maus tratos, invocando o artigo 3.º da CEDH.

O TEDH, numa decisão que parece equilibrada, recordou que foi o próprio Robert quem pediu a adaptação da pena, e não a repetição do julgamento, embora o modo como conduziu o processo interno desse a entender que pretendia a repetição do julgado.

Sucede que, tratando-se do cumprimento da pena, o art.º 7.º da CEDH não é, segundo jurisprudência constante do TEDH, aplicável. Por outro lado, a matéria da execução das penas criminais não releva do artigo 6.º da CEDH (apenas a própria matéria criminal, em sede de julgamento – não a execução da sentença). Enfim, da conduta das autoridades, não resulta a imposição de maus tratos. Para além do mais, se este modo de operar da justiça francesa foi legítimo, dele não resulta a imposição de maus tratos a Robert.

O caso, embora apenas de decisão de inadmissibilidade, é interessante, na medida em que uma decisão penal cujo fundamento seja legítimo não deve ser revista ou substituída por outra, no país do cumprimento da pena. Em contrapartida, a pena aplicável à pessoa condenada transferida, deverá ser adaptada no país de execução da pena, nomeadamente para a por em conformidade com os máximos legais penais. 


Autor: Paulo Marrecas Ferreira

Fonte: Tribunal Europeu dos Direitos Humanos