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"Banco Mundial trata os direitos humanos como uma doença infecciosa", alerta perito da ONU

30 set 2015

O Relator Especial das Nações Unidas sobre pobreza extrema e direitos humanos, Philip Alston, lançou um apelo ao Banco Mundial e seus Estados membros para que adoptem uma abordagem nova e coerente aos direitos humanos.

“Para muitos efeitos, o Banco Mundial é actualmente uma zona sem direitos humanos. Nas suas políticas operacionais, em particular, trata os direitos humanos mais como uma doença infecciosa do que como valores e obrigações universais”, afirma Philip Alston no seu mais recente relatório acabado de publicar, sobre a abordagem aos direitos humanos do Banco Mundial, o mais importante agente internacional no alívio da pobreza.

O relatório, que será oficialmente apresentado à Assembleia Geral da ONU a 23 de Outubro, explica que o maior obstáculo a uma melhor integração dos direitos humanos no trabalho do Banco Mundial “é a interpretação anacrónica e incoerente da proibição política contida nos Estatutos do Banco.”

“Invocam os Estatutos do Banco, que foram adoptados em 1945, e alegam que esta cláusula de não interferência nos assuntos políticos dos Estados proíbe de facto o Banco de tratar de questões de direitos humanos”, declara o perito.

Porém, sublinha, “este Estatuto foi escrito há mais de 70 anos, quando não existia qualquer catálogo internacional de direitos humanos, nenhumas obrigações concretas impostas por tratado aos Estados e nenhuma instituição internacional para tratar de tais assuntos.”

No seu relatório, Philip Alston considera que – apesar dos argumentos jurídicos – a verdadeira razão que leva o Banco Mundial a evitar a abordagem dos direitos humanos é claramente política.

“Os países ocidentais, com o apoio da sua sociedade civil, têm muitas vezes levado o Banco a sancionar os países em desenvolvimento com problemas de direitos humanos, atrasando ou suspendendo os empréstimos para fins de desenvolvimento a estes países. Os países que contraem empréstimos junto do Banco, ou os Estados membros críticos dos direitos humanos, não querem que o Banco Mundial se transforme num polícia dos direitos humanos que se imiscui nos seus assuntos internos”, explica. 

Para o Relator Especial, todas estas abordagens estão equivocadas. “A culpa é dos Estados membros do Banco Mundial de todas as partes do mundo”, diz.

“A utilização de um enquadramento de direitos humanos faz uma enorme diferença e é precisamente por isso que o Banco resiste tanto a usá-la”, observa o perito, sublinhando que os direitos humanos invocam obrigações jurídicas assumidas pelos Estados e trazem uma certa margem de certeza jurídica. “Mesmo a linguagem dos direitos reconhece a dignidade e importância de todas as pessoas.”

“É espantoso como se pensou pouco na forma como uma política de direitos humanos do Banco Mundial se poderá configurar na prática. Agora, é tempo de o presidente do Banco Mundial, Jim Yong Kim, tomar a iniciativa”, diz Philip Alston no seu relatório. “Mas os Estados membros do Banco Mundial têm também uma responsabilidade: devem começar a pensar seriamente na configuração de uma política de direitos humanos do Banco Mundial e devem começar a fazê-lo hoje mesmo!”

O Relator Especial das Nações Unidas passará as próximas semanas em conversações com o Banco Mundial e seus Estados membros sobre as recomendações contidas no relatório, antes da apresentação oficial deste à Assembleia Geral das Nações Unidas, em Nova Iorque.


Autor: Raquel Tavares

Fonte: www.ohchr.org