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Brasil instado a não expulsar tribos guarani e kaiowá das suas terras ancestrais

12 ago 2015

A Relatora Especial das Nações Unidas sobre os direitos dos povos indígenas, Victoria Tauli-Corpuz, emitiu ontem um comunicado instando o governo do Brasil a “garantir que os direitos humanos dos membros das tribos indígenas guarani e kaiowá são rigorosamente respeitados, em estrita conformidade com as normas internacionais que protegem os direitos dos povos indígenas.”

A perita manifestou profunda preocupação com relatos segundos os quais a polícia está disposta a expulsar à força tribos indígenas guarani e kaiowá das suas Tekohas (terras tradicionais), no estado de Mato Grosso do Sul, na parte ocidental do país. Cerca de 6000 pessoas de origem indígena recusam-se a abandonar as suas Tekohas e avisaram que pensam resistir à expulsão “até à morte”.

Alegadamente, agentes da polícia civil terão chegado a diversas comunidades indígenas no passado Sábado, dia 8 de Agosto. Embora nenhuma expulsão tenha ocorrido, as comunidades temem que a presença da polícia indique a intenção de cumprir as ordens de despejo emitidas em Julho de 2015 pelos tribunais federais.

“Os povos indígenas não devem ser afastados à força das suas terras ou territórios”, disse Victoria Tauli-Corpuz, recordando a Declaração das Nações sobre os Direitos dos Povos Indígenas. “Nenhum realojamento deve ter lugar sem o consentimento livre, prévio e informado das comunidades afectadas e após acordada uma indemnização justa, se possível com a opção de regresso.”

“Dada a actual situação de insegurança e desconfiança no estado de Mato Grosso do Sul, incluindo questões já antigas ainda por resolver sobre a titularidade das terras tradicionais, bem como os actuais padrões de violência, receio pela segurança das comunidades indígenas afectadas, caso esta expulsão tenha lugar”, sublinhou a perita.

As tribos guarani e kaiowá lutam há décadas para reconquistar os seus direitos sobre terras ancestrais que estão agora, em larga medida, sob o controlo de ocupantes de origem não indígena. Esta situação levou aos ataques violentos actualmente cometidos contra comunidades indígenas por grupos armados alegadamente pagos por lavradores e proprietários rurais não indígenas, que têm interesses comerciais muito significativos na região, em larga medida relacionados com empresas agrícolas de escala industrial.

Alegadamente, estão a ser enviados grupos armados para atacar e intimidar as comunidades, numa campanha para espalhar o terror psicológico e garantir que as comunidades cumprem as ordens de despejo. Isto fará supostamente parte de um padrão já antigo de conflito e violência entre as comunidades indígenas e os proprietários rurais, que já levou à morte de mais de 290 pessoas de etnia guarani ou kaiowá, incluindo líderes comunitários, desde 2003.

As tribos indígenas guarani e kaiowá vivem há séculos no estado de Mato Grosso do Sul. A possibilidade de ocuparem as suas terras tradicionais tem, contudo, vindo a ser limitada ao longo do último século. Na década de 1920, muitas comunidades indígenas foram alojadas à força, pelo Estado, nas chamadas “Reservas Índias”. Na década de 1940, outras comunidades foram deslocadas à força das suas terras tradicionais para dar lugar a ocupantes de origem não indígena, que colonizaram essas áreas a fim de desenvolver empresas agrícolas de larga escala.

Hoje, muitos guarani e kaiowá continuam a lutar pelo reconhecimento oficial das suas terras tradicionais, onde residem, apesar de enfrentarem crises humanitárias em termos de acesso a comida, água potável e serviços de saúde.”

A Relatora Especial sobre os direitos dos povos indígenas, Victoria Tauli-Corpuz (Filipinas) é uma activista de direitos humanos que trabalha na área dos direitos dos povos indígenas. Há mais de três décadas que o seu trabalho se centra na construção de movimentos entre os povos indígenas e também entre as mulheres, tendo trabalhado como educadora-formadora na área dos direitos humanos, desenvolvimento e povos indígenas, em vários contextos. É membro da tribo Kankana-ey, povos indígenas Igorot da Região de Cordillera, nas Filipinas. Enquanto Relatora Especial, é independente de qualquer governo ou organização e exerce funções a título pessoal. 


Autor: Raquel Tavares

Fontewww.ohchr.org