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Crise migratória na Europa: é impossível fechar as fronteiras, adverte perito da ONU

16 jun 2015

A capacidade dos migrantes de chegar à Europa apesar do colossal investimento na segurança das fronteiras internacionais demonstra que o encerramento destas é impossível e só serve para dar mais poder àqueles que se dedicam ao tráfico de seres humanos no Mediterrâneo, declarou ontem o Relator Especial das Nações Unidas sobre os direitos humanos dos migrantes, François Crépeau, na apresentação do seu mais recente relatório ao Conselho de Direitos Humanos.

“A União Europeia e seus Estados membros têm de reconhecer que a migração irregular resulta das políticas que proíbem a imigração”, afirmou o Relator Especial. “Essas políticas servem apenas para abrir um novo e lucrativo mercado às redes de auxílio à imigração ilegal, um mercado que não poderia existir sem esta proibição.”

“Se a Europa insistir em dedicar a maioria dos seus recursos à securização, não conseguirá vencer as redes de auxílio à imigração ilegal”, advertiu o perito. “A Europa necessita de destruir o modelo de negócio dos que auxiliam a imigração ilegal, criado quando foram erguidas as barreiras e proibições à mobilidade de pessoas e que prospera conseguindo contornar as restritivas políticas de imigração dos Estados Membros da UE.”

Mais de 200,000 migrantes e requerentes de asilo chegaram à Europa por via marítima em 2014, face a 80,000 em 2013, segundo as actuais estimativas. Este ano, a Europa recebeu até agora mais de 100,000 migrantes e requerentes de asilo chegados de barco, com alguns Estados costeiros a reportar chegadas diárias.

“Os migrantes virão, não importa como”, avisou François Crépeau. “A UE só conseguirá voltar a ter o controlo da sua fronteira se apostar na mobilidade. Apostar na mobilidade significa que o objectivo geral consiste em garantir que a maioria dos migrantes utiliza os canais oficiais para entrar e permanecer na Europa.”

O perito apelou à UE para que estabeleça uma política de imigração baseada nos direitos humanos, coerente e abrangente que tenha a mobilidade como ponto principal. “É a única forma de reganhar a sua fronteira, combater eficazmente o auxílio à imigração ilegal e capacitar os migrantes”, afirmou o Relator Especial.

“É preciso que a UE desenvolva mais políticas de redução dos danos, tendo como preocupação central os direitos humanos dos migrantes e criando opções de mobilidade inovadoras e reguladas que incentivem a maioria dos migrantes e requerentes de asilo a evitar o recurso ao auxílio à imigração ilegal", observou. “Em vez de forçar as pessoas a recorrer a mecanismos que não respondem às suas necessidades, temos de compreender a lógica das suas decisões e criar políticas que façam corresponder da melhor forma as aptidões dos migrantes e as necessidades do mercado de trabalho”.

“Só então poderá a UE tirar o mercado da mobilidade das mãos das redes de auxílio à imigração ilegal. O investimento deve ser feito numa mobilidade aberta e regulada para pessoas com todos os níveis de habilitações”, sublinhou François Crépeau. 

O Relator Especial congratulou-se com a nova Agenda Europeia sobre Imigração, mas considerou que os números para a reinstalação de refugiados são insuficientes e que a falta de canais abertos e regulares para os imigrantes com baixo nível de habilitações que chegam à Europa é uma enorme lacuna.

“O facto é que os Estados membros da União Europeia dependem da mão-de-obra barata dos imigrantes em certos sectores da sua economia”, disse. “Os Estados devem reconhecer as suas reais necessidades de trabalho, incluindo de trabalho com baixa remuneração: não o fazer levá-los-á a ser simplesmente cúmplices da exploração dos migrantes”, sublinhou.

O perito apelou à UE para que abra mais canais de imigração regulares e, simultaneamente, puna os empregadores sem escrúpulos que exploram o medo dos requerentes de asilo e migrantes indocumentados de serem detectados, detidos e deportados. “A implementação efectiva da directiva sobre a punição dos empregadores deve ser uma prioridade”, sublinhou.

“A combinação de tais políticas levaria à redução dos mercados clandestinos, das travessias irregulares das fronteiras, do auxílio à imigração ilegal, da exploração laboral e das violações dos direitos dos migrantes”, declarou François Crépeau.


Autor: Raquel Tavares

Fontewww.ohchr.org