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Declaração Conjunta sobre a Protecção no Mediterrâneo à Luz da Decisão do Conselho da UE de 23 de Abril de 2015

28 abr 2015

Altos dignitários internacionais – Alto Comissário das Nações Unidas para os Refugiados, António Guterres, Alto Comissário das Nações Unidas para os Direitos Humanos, Zeid Ra'ad Al Hussein, Representante Especial do Secretário-Geral para as Migrações Internacionais e o Desenvolvimento, Peter Sutherland, e Director-Geral da Organização Internacional para as Migrações, William Lacy Swing – emitiram ontem uma declaração conjunta reagindo à Decisão adoptada pelo Conselho da UE no passado dia 23 de Abril em resposta à recente tragédia que se viveu no Mediterrâneo

“Dada a intensificação dos movimentos de barcos e a contínua e insuportável perda de vidas no Mar Mediterrâneo, nós, abaixo assinados, tomamos nota da decisão do Conselho Europeu Especial de 23 de Abril de 2015. Reconhecemos o compromisso específico assumido pelo Conselho de mobilizar todos os esforços ao seu dispor para prevenir mais perdas de vidas no mar e combater as causas profundas da emergência humana.”

“A decisão do Conselho é um importante primeiro passo no sentido de uma acção colectiva à escala europeia, única abordagem que poderá responder a um fenómeno com tal escala, complexidade e natureza transnacional. Ajudará também a abrir caminho à elaboração de uma nova Agenda da UE para as Migrações.

Foi decidido adoptar várias medidas preliminares. Percebemos que os pormenores têm ainda de ser trabalhados em consulta com diversas partes interessadas, incluindo as instituições que representamos, e prometemos apoiar plenamente o seu desenvolvimento futuro.

A anunciada triplicação dos recursos atribuídos às Operações Triton e Poseidon do Programa Frontex é encorajadora na medida em que resulte num aumento dos salvamentos de migrantes e refugiados em perigo no mar e no futuro próximo. Embora os esforços dos navios mercantes devam ser saudados e aplaudidos, tais navios não estão equipados da melhor forma para resgatar centenas de pessoas ao mesmo tempo e não substituem uma resposta abrangente, liderada pela UE e dotada dos recursos adequados, com um enfoque particular na satisfação das necessidades de protecção dos migrantes e refugiados vulneráveis, sobretudo crianças não acompanhadas, vítimas de violência e pessoas com necessidades especiais.

Uma série de medidas propostas centram-se no combate ao auxílio à imigração ilegal e movimentos daí decorrentes, em cooperação com países terceiros. Mas é preciso que as medidas policiais sejam acompanhadas por esforços tendentes a reduzir a necessidade sentida pelos migrantes e refugiados de recorrer desde logo àqueles que auxiliam a imigração ilegal. A situação actual exige medidas que vão além da segurança fronteiriça.

A maioria dos casos de auxílio à imigração ilegal não implica o crime de tráfico. É importante manter esta distinção nas declarações e medidas empreendidas em resposta à actual crise. Além disso, as pessoas que recorrem aos que auxiliam a imigração ilegal e que caem vítimas dos traficantes não são criminosas.

Aqueles barcos transportam seres humanos que são titulares de direitos humanos e necessitam de ajuda e protecção internacionais. É imperativo que todas as medidas respeitem escrupulosamente o Direito Internacional dos Direitos Humanos, Direito Internacional dos Refugiados, Direito Internacional Humanitário e Direito do Mar, e garantam que os migrantes são tratados de forma digna, segura e humana.

Estamos dispostos a trabalhar com os Estados Membros e instituições da UE na definição de acções concretas que respeitem os direitos de todos os migrantes e refugiados, e em consultas com vista a aumentar a oferta de locais de reinstalação, providências para a prestação de assistência antes e depois da chegada e medidas de deslocalização para aliviar o fardo dos Estados da fronteira sul da Europa.

Os esforços para deter o auxílio à imigração ilegal serão em vão se não forem adoptadas medidas para inverter políticas migratórias demasiado restritivas na Europa, bem como os factores geradores dos conflitos, violações de direitos humanos e carência económica em muitos dos países de origem e trânsito. As medidas coercivas têm de respeitar as normas aplicáveis na área da aplicação da lei e administração da justiça.

Num momento em que as Instituições e Estados Membros da UE trabalham no desenvolvimento de uma Agenda Europeia para as Migrações, esperamos a trabalhar de perto com a UE e outros interessados para alargar e melhorar as medidas anunciadas, a fim de por em prática um plano mais holístico e compatível com as normas e padrões internacionais.

A este respeito, acreditamos que são necessárias medidas adicionais, para além das já anunciadas, para responder aos muitos factores que obrigam as pessoas a viajar em condições tão precárias e transformar isto numa resposta verdadeiramente completa. Tais medidas poderiam incluir, por exemplo: a implementação de políticas migratórias que satisfaçam as reais necessidades do mercado de trabalho; o aumento da oferta de canais seguros e regulares para a entrada, nomeadamente facilitando e tornando mais rapidamente acessível a reunificação familiar; fazendo o Sistema Europeu Comum de Asilo trabalhar de forma mais coesa, especialmente através de medidas de solidariedade intra-europeia; fazer investimentos de desenvolvimento mais bem orientados e bem fundamentados nos países de origem e de trânsito; rever as medidas relativas às práticas comerciais e à imigração para fins laborais; combater o tráfico de armas; promover proactivamente uma resolução de litígios pacífica; e combater vigorosamente todas as formas de racismo, intolerância religiosa e xenofobia.

A comunidade internacional tem uma responsabilidade partilhada de garantir a protecção dos migrantes e refugiados que atravessam o Mar Mediterrâneo. A escala, complexidade e sofisticação da resposta devem ser compatíveis com a escala e complexidade do problema. Necessitamos de uma resposta verdadeiramente global que sirva de testemunho aos que se perdem no mar e aos que sobrevivem para contar a experiência.

As instituições que representamos têm, todas elas, um papel a desempenhar na solução para a tragédia em curso no Mediterrâneo. Estamos a delinear planos para aumentar o nosso apoio em diversas áreas indicativas, por exemplo:

Representante Especial do Secretário-Geral para as Migrações Internacionais e o Desenvolvimento: diplomacia activa junto dos Estados da Europa, África e resto do mundo tendo em vista salvaguardar os direitos de todos os migrantes e promover políticas migratórias justas e equitativas que contribuam para um desenvolvimento sustentável.

Alto Comissário das Nações Unidas para os Refugiados: aumento do apoio operacional, conforme necessário, no Sul e Sudeste da Europa, Norte de África e Corno de África; apoio a várias propostas já apresentadas no âmbito da Iniciativa para o Mar Mediterrâneo Central, incluindo: aumento da reinstalação de refugiados, reforço da reunificação familiar e outras formas de admissão, apoio a medidas de solidariedade e partilha de responsabilidade intra-UE, nomeadamente ao nível do realojamento mediante um eventual projecto-piloto para a recepção de cidadãos sírios na Grécia e Itália, e campanhas de informação ao longo das rotas de trânsito a fim de informar as pessoas dos riscos de prosseguir a viagem; difusão do Guia SAR desenvolvido em conjunto com a Organização Marítima Internacional e a Câmara Internacional de Navegação.

Alto Comissário das Nações Unidas para os Direitos Humanos: difusão das Directrizes e Princípios do Alto Comissariado sobre Direitos Humanos nas Fronteiras Internacionais; apoio a um inquérito independente sobre os recentes incidentes trágicos no Mediterrâneo; prestação de consultoria sobre os direitos humanos de todos os migrantes nos pontos de origem, trânsito e destino; promoção do cumprimento das normas internacionais de direitos humanos no âmbito da aplicação da lei; combate a todas as formas de racismo, intolerância religiosa e xenofobia.

Organização Internacional para as Migrações: implementação do projecto Migrantes Desaparecidos, o qual procura documentar a perda de vidas; cooperação e implementação de medidas de combate ao auxílio à imigração ilegal e tráfico de seres humanos; implementação de um Mecanismo de Recurso e Resposta para os Migrantes ao longo das rotas migratórias dos principais países da África sub-Sahariana a fim de identificar as pessoas necessitadas de ajuda, oferecer aconselhamento, proceder a encaminhamentos e prestar assistência, nomeadamente através do regresso voluntário dos migrantes por motivos económicos; apoio aos Programas de Desenvolvimento Regional e Protecção da UE; resposta ao apelo especificamente dirigido à OIM na conclusão do Conselho da UE, trabalhando em prol do reforço das capacidades nos países de origem e apoiando estes países no regresso voluntário e reintegração a fim de assegurar que o regresso integra uma resposta completa.”


Autor: Raquel Tavares

Fontewww.ohchr.org