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“Impiedosa” política de imigração da UE custa vidas

22 abr 2015

No rescaldo da perda de pelo menos 700 vidas humanas na sequência do naufrágio do barco transportando imigrantes no passado fim de semana, o Alto Comissário das Nações Unidas para os Direitos Humanos, Zeid Ra'ad Al Hussein, instou esta semana os governos da União Europeia a seguir “uma abordagem mais sofisticada, mais corajosa e menos impiedosa” para responder aos fluxos de migrantes que pretendem entrar na Europa. 

“À medida que vamos conhecendo novos dados sobre ainda mais homens, mulheres e crianças que perderam as vidas na busca de uma vida melhor e mais segura em outro país, estou horrorizado mas não surpreendido com esta última tragédia. Estas mortes, e as centenas de outras que as antecederam nos últimos meses, eram tristemente previsíveis”, disse o Alto Comissário Zeid Ra'ad Al Hussein. “São o resultado de um contínuo falhanço das políticas, acompanhado por uma monumental falta de compaixão.”

“Embora o programa italiano Mare Nostrum, que terminou no passado mês de Outubro, tenha constituído um esforço corajoso, e em muitos aspectos bem-sucedido, para salvar vidas, a mais modesta Operação Triton não é simplesmente adequada às exigências da situação”, prosseguiu o Alto Comissário, considerando a mesma totalmente desadequada e “mais orientada para o controlo fronteiriço e o policiamento dos mares do que para o resgate de vidas.”

“Interromper o salvamento de migrantes em perigo não levou à diminuição da imigração, nem na verdade à redução do auxílio à imigração ilegal, mas apenas a mais mortes no mar, como demonstra esta recente tragédia”, acrescentou. “A operação Tritão deve ser imediatamente substituída por uma resposta operacional de busca e salvamento no Mediterrâneo robusta, à escala europeia, liderada pelos Estados e dotada dos recursos adequados”.

“Estas desesperadas viagens marítimas têm como pano de fundo violações de direitos humanos. Temos vindo a destacar reiteradamente que ninguém com comida para se alimentar, a salvo da tortura, da violação e dos bombardeamentos, com cuidados de saúde para a sua família, educação para os filhos, trabalho decente e produtivo, estaria disposto a empreender estas perigosas viagens. No meio de todo o discurso sobre os factores de atracção, é preciso compreender que estes são os factores de repulsão e dizer claramente que os actuais movimentos que atravessam o Mediterrâneo raramente são inteiramente voluntários na verdadeira acepção da palavra.”

“A Europa está a voltar as costas a alguns dos migrantes mais vulneráveis do mundo e arrisca-se a transformar o Mediterrâneo num vasto cemitério em vez de reconhecer que as economias e sociedades europeias necessitam do trabalho com baixas qualificações que os migrantes estão desesperados para oferecer, que os refugiados têm o direito de procurar asilo ou que as famílias têm o direito de viver juntas, e de abrir canais seguros e legais para a sua entrada”, declarou Zeid Al Hussein.

É precisamente esta falta de canais regulares, associada a mecanismos duros de controlo das fronteiras externas, que leva os migrantes a recorrerem à florescente e cada vez mais bem organizada indústria do auxílio à imigração ilegal em toda a fronteira sul da Europa, considerou o Alto Comissário, acrescentando que “o auxílio à imigração ilegal constitui o sintoma e não a causa desta terrível situação”.

É tempo de os políticos demonstrarem uma liderança corajosa sobre esta matéria, em vez de se juntarem ao clamor irreflectido por políticas de dissuasão ainda mais duras. Essas políticas não só não funcionam, como resultam em custos inaceitáveis em termos de vidas humanas, sofrimento humano e direitos humanos”, afirmou o Alto Comissário.

“Não sei quantas mais tragédias deste tipo terão de acontecer até que os governos europeus se comprometam a colocar o resgate de vidas, bem como uma governação coerente em matéria de migração, à frente das reacções políticas míopes e de curto prazo de cedência aos movimentos xenófobos populistas que têm vindo a envenenar a opinião pública nesta área.”

O facto é que todos os migrantes, independentemente do seu estatuto jurídico, de como chegam às fronteiras marítimas, de onde partiram ou da sua raça, religião ou nacionalidade, têm direitos humanos, lembrou o Alto Comissário.

“Apelo à comunidade internacional para que leve a cabo com urgência um inquérito independente a estes acontecimentos e comprometo-me a garantir o apoio do Alto Comissariado a tal inquérito. Nada menos é devido aos muitos migrantes que morreram, ficaram feridos e sofreram outras horríveis violações de direitos humanos na tentativa de chegar à Europa.”


Autor: Raquel Tavares

Fontewww.ohchr.org