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Peritos da ONU preocupados com liberdades de reunião e de associação em Espanha

24 fev 2015

Um grupo de cinco peritos de direitos humanos da ONU instou ontem o Estado espanhol a rejeitar duas alterações legislativas que “ameaçam violar os direitos e liberdades fundamentais dos indivíduos”. O apelo dos peritos surge após o Congresso espanhol ter acelerado a aprovação de uma proposta de reforma do Código Penal relativa aos crimes de terrorismo.

“Confiamos que Espanha tomará as providências necessárias para garantir o exercício dos direitos fundamentais e liberdades públicas na sua legislação nacional, em conformidade com as normas internacionais”, afirmaram os peritos referindo-se a esta proposta, bem como a dois outros projectos de reforma actualmente em discussão no Senado: a reforma do Código Penal na parte relativa aos crimes de atentado à ordem pública e a reforma da Lei de Bases sobre a Protecção da Segurança Pública.

“Os direitos de manifestação pacífica e de expressão colectiva de uma opinião são fundamentais para a existência de uma sociedade livre e democrática”, declararam os Relatores Especiais. “Preocupa-nos que as propostas de reforma possam ser uma resposta do governo e do poder legislativo às numerosas manifestações que têm tido lugar em Espanha nos últimos anos.”

Sobre o projecto de reforma do Código Penal, os peritos disseram que “o texto do projecto de reforma inclui definições amplas ou ambíguas que abrem caminho a uma aplicação da lei desproporcional ou discricionária pelas autoridades”

Por exemplo, o projecto de reforma considera “factores agravantes” uma série de delitos susceptíveis de serem cometidos no contexto de uma “grande reunião”. Está a ser procurada uma base legal para este novo tipo de “factores agravantes” a fim de aumentar automaticamente a pena aplicável nos casos de protesto. Tal contraria o direito internacional dado que pode ter como efeito prejudicar o exercício da liberdade de reunião pacífica”, destacou a Relatora Especial das Nações Unidas sobre os direitos de reunião pacífica e de associação, Maina Kiai.

O projecto de reforma propõe ainda a aplicação de penas de prisão ou multa para punir as pessoas que difundam publicamente mensagens ou slogans que incitem à prática de crimes de atentado à ordem pública ou sirvam para reforçar a intenção de os praticar. A este propósito, o Relator Especial das Nações Unidas sobre liberdade de expressão, David Kaye, disse que “o texto da lei é problemático e os crimes, tal como se encontram tipificados, podem criminalizar a conduta das pessoas que convocam manifestações pacíficas.”

Além disso, os peritos da ONU observaram que a tipificação dos crimes de terrorismo e as disposições relativas à criminalização dos actos de incitamento e glorificação ou justificação do terrorismo contidas no projecto de reforma do Código Penal são demasiado amplas e vagas.

“Tal como redigida, a legislação contra o terrorismo poderá criminalizar condutas que, de outra forma, não constituiriam terrorismo e pode resultar em restrições desproporcionais ao exercício da liberdade de expressão, entre outras limitações”, observou o Relator Especial David Kaye. “O projecto de lei pode também permitir a utilização abusiva dos mecanismos de supervisão e supressão de informação disponível na Internet.”

Quanto ao projecto de reforma da Lei de Bases sobre a Protecção da Segurança Pública, foi dito que: “a chamada lei da rolha viola a própria essência do direito de reunião, uma vez que penaliza uma ampla variedade de acções e condutas que são essenciais ao exercício deste direito fundamental, assim limitando drasticamente o seu exercício”, afirmou a Relatora Especial Maina Kiai.

“Este projecto de reforma restringe desnecessária e desproporcionalmente liberdades básicas como o exercício colectivo da liberdade de opinião e de expressão”, declarou David Kaye.

Além disso, as disposições do projecto de reforma relativas ao estatuto especial de Ceuta e Melilla, “podem permitir a deportação imediata para os seus países de origem de pessoas em risco de serem sujeitas a tortura e outras formas de maus-tratos, em violação das disposições do direito internacional dos direitos humanos”, afirmaram os peritos.

“Considerando o impacto que tais leis podem ter nos direitos e liberdades fundamentais, é imperativo que sejam redigidas de forma cuidadosa e não podem ser adoptadas à pressa”, concluíram os peritos.

As advertências dos dois peritos independentes foram endossadas pelos Relatores Especiais das Nações Unidas sobre direitos humanos e combate ao terrorismo (Ben Emmerson); direitos humanos dos migrantes (François Crépeau) e situação dos defensores de direitos humanos (Michel Forst).


Autor: Raquel Tavares

Fontewww.ohchr.org