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TEDH, 10 de maio de 2016, Derungs c. Suiça

16 maio 2016

Dependência em excesso do álcool. Psicopatia.  Condenação em pena de prisão, com relevância penal, de curta duração, substituída por internamento por vários anos, sem colocação em liberdade, no ano de 2004. Vários recursos da detenção. No final, pedido de colocação em liberdade, apreciado 11 meses depois de formulado e sem concessão de audiência. CEDH artigo 5.º § 4, demora na apreciação do recurso da detenção, violação. CEDH, artigo 5.º § 4, não concessão de audiência, não violação.

Colocação em liberdade em 17 de Janeiro de 2012.

Derungs, cidadão suíço com um longo historial de perturbações à ordem pública provocadas pelo álcool e com frequência repetida de terapias para desintoxicação, foi surpreendido a conduzir sob a influência do álcool. No quadro penal aplicável na Confederação Helvética, veio a ser punido em 6 meses de prisão, reduzidos a 4, pena entretanto suspensa a pedido do serviço psiquiátrico do Cantão dos Grisons, e substituída por uma medida de internamento de longa duração com a promessa de colocação em liberdade sujeita à verificação de melhora da condição de saúde mental de Derung. Este, que iniciou a sua prisão em 2004, entretanto substituída pela sua institucionalização, veio a permanecer em tratamento até à sua colocação em liberdade em Janeiro de 2012.

Ao longo da sua institucionalização formulou vários recursos contra a detenção, os quais não foram atendidos, uma vez que os relatórios periciais não atestavam melhorias na condição de saúde.

O último destes recursos foi apresentado em 2010 e tardou 11 meses a ser apreciado. Derung queixou-se ao TEDH pela violação do direito a um recurso contra a detenção facultado pelo artigo 5.º (direito à liberdade e segurança), § 4 (direito ao recurso da detenção), da CEDH.

O TEDH apreciou cuidadosamente o caso de Derung e verificou que, no conjunto dos passos processuais para a apresentação de um recurso da detenção, estava um prévio recurso hierárquico necessário. Ora, se o artigo 5.º § 4 concede a qualquer cidadão um recurso judicial, a natureza judicial deste não impõe que seja enxertado a este processo, um recurso hierárquico prévio de esgotamento obrigatório e de natureza administrativa – graciosa, logo não judicial. Este recurso hierárquico necessário representou uma complexidade do processo, face a uma substância da causa sem complexidade (o caso deste cidadão é de uma relativa simplicidade) e em que o comportamento do requerente em nada tinha contribuído para a demora. Logo, a complexidade processual introduzida por este elemento de natureza não judicial, o recurso hierárquico de natureza administrativa graciosa, obrigatório, provocou a demora, a qual foi imputável ao Estado Suíço, obrigado pelo art.º 5.º § 4 da CEDH a facultar um recurso célere da colocação em detenção, precisamente pela importância do que está em jogo, a liberdade individual.

Já na dimensão do direito à audiência, embora, em termos gerais, o artigo 5.º § 4 a imponha, na medida em que uma pessoa privada da liberdade deve poder trazer a tribunal as razões que militam, em seu entender, no sentido da sua colocação em liberdade, o TEDH entendeu que não houve violação do mesmo art.º 5.º § 4 da CEDH. Socorreu-se para o efeito da sua jurisprudência proferida, nomeadamente, no caso Ruiz Rivera, na qual afirmara o direito à audiência da pessoa que reclama a sua colocação em liberdade, e observou que Derungs foi ouvido, com o seu advogado, pelas autoridades que ordenaram a sua detenção, depois de ter tido acesso ao seu processo que pôde examinar detalhadamente, e que as autoridades judiciais, que vieram a decidir o seu recurso, examinaram com cuidado as suas afirmações então proferidas, citando-as, debatendo-as e analisando-as em detalhe.  Não houve assim, quanto ao direito à audiência, a violação do artigo 5.º § 4 da CEDH, uma vez que a exposição de Derungs foi apreciada na sua substância pelo tribunal.


Autor: Paulo Marrecas Ferreira