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TEDH, 7 de abril de 2016, Ali Cheema e outros c. Grécia

11 abr 2016

23 reclusos na prisão de Larissa protestaram contra as condições de detenção. Capacidade do estabelecimento penitenciário. Duração das penas. Espaço disponível na celas por recluso. Higiene na prisão. Maus tratos, CEDH, art. 3.º, violação. Ausência de recurso efetivo das condições de detenção. Art.º 13.º CEDH, violação.

23 reclusos no estabelecimento prisional de Larissa, em cumprimento de penas de duração relativamente longa, queixaram-se ao TEDH das suas condições de detenção e da ausência de recurso adequado e disponível para pôr termo a estas deficientes condições de vida na prisão.

O TEDH, após aceitar como admissíveis as várias queixas, considerando a desistência comprovada de um dos reclusos e a manutenção no rol das queixas de outro, que alegadamente teria desistido, examinou em primeiro lugar o espaço disponível na prisão de Larissa.  As várias alas do estabelecimento pelas quais se repartem os vários indivíduos têm capacidades próprias, sendo que o estabelecimento teria sido concebido para um número de pessoas, de cerca de 600 detidos mas estaria com uma lotação próxima de 892 pessoas, com momentos de maior ocupação do espaço disponível. Cada cela tem uma superfície disponível de cerca de 23 m2 e dispõe de cinco camas em beliches, de uma mesa  e de várias cadeiras. Num espaço suplementar de 5 m2, existem um WC, um duche e uma torneira. Em condições ótimas o espaço disponível por pessoa rondaria os 3 m2. Além da sobrelotação prisional, o Comité para a Prevenção da Tortura do CoE, em visita anterior cuja validade se mantém, verificou que as várias alas da prisão estavam infestadas de insetos, nomeadamente de piolhos, e que os colchões e os cobertores facultados pelo EP estavam sujos. Não eram fornecidos produtos de higiene corporal em quantidade bastante, o que levava os reclusos a terem de os adquirir na loja da prisão, ou a ter de os pedir a familiares. Enfim, o aquecimento era reduzido no inverno, pelo que os reclusos tinham que dormir com a roupa do dia.

Conhecedor da situação em vários Estados parte no CoE, o TEDH socorreu-se da sua própria jurisprudência para estabelecer alguns princípios gerais relevantes para a solução a dar ao caso.

O primeiro é o tempo de prisão. Quanto mais prolongado for o tempo de reclusão em condições deficientes, mais grave e mais patente se torna uma possível violação do artigo 3.º da CEDH (proibição da tortura). O segundo é o do espaço disponível. Ou seja, a falta patente de espaço disponível numa prisão é um muito forte indício da existência de condições degradantes na mesma. O terceiro princípio geral é relativo à prova. Não se pode exigir de quem dispõe de poucos recursos probatórios (informação, documentação, capacidade de expressão) a produção de uma prova total, segundo a velha regra affirmanti incumbit probatio. Basta a esta pessoa, mal apetrechada frente a uma organização institucionalizada, poderosa, dotada de pessoal, fornecer um princípio de prova, uma prova prima facie. À parte mais poderosa nesta relação processual, caberá desfazer o princípio de prova com uma prova para além de qualquer dúvida razoável. Não satisfazendo esta parte este ónus, o Tribunal retira dos factos as presunções necessárias para sustentar a sua decisão.

Distinguindo as várias categorias de requerentes (em razão, nomeadamente do lugar da prisão onde se encontram em cumprimento de pena), o TEDH aplicou estes princípios ao caso sub judice.  A tarefa não lhe foi difícil. Além das alegações dos vários reclusos dando – com exceção do requerente n.º 7 – um quadro detalhado do circunstancialismo sofrido na prisão, o TEDH dispunha ainda do relatório recente do CPT relativo às condições de detenção na Grécia, em particular no EP de Larissa. Nas várias celas era frequente a ocupação destas ser de seis a nove reclusos. O que deixava a cada pessoa, um espaço disponível oscilando entre 3,8 m2 e 2,5 m2, com picos temporais relativamente alargados de disponibilidade de espaço inferior a 3m2 por recluso. Acrescendo à verificação da sobrelotação, o tempo relativo de ocupação (penas de duração média), e a falta de higiene, o TEDH considerou verificar-se a violação do art.º 3.º da CEDH. De uma jurisprudência consolidada anterior, sem a verificação de uma modificação superveniente do regime jurídico aplicável, o TEDH já possuía a certeza da não efetividade e da completa inadequação de qualquer recurso que fosse apresentado como disponível. Pelo que, pela falta de recurso disponível adequado e suficiente para reparar a violação do art.º 3.º da CEDH, o TEDH concluiu pela violação do art.º 13.º deste instrumento de direito internacional público (direito a um recurso efetivo). 


Autor: Paulo Marrecas Ferreira