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TEDH, 7 de maio de 2015, S.L. e J.L. c. Croácia

11 maio 2015

Jovens nascidas em 1987 e 1992. Aquisição, por sua parte, de uma vivenda à beira da praia em 1997 mediante representação da sua mãe. Superveniência de dificuldades económicas. Permuta da vivenda por um apartamento de valor muito inferior no centro da cidade. Melhor Interesse das crianças. Direito de propriedade – violação.

Em 1997 as queixosas, SL e JL adquiriram, representadas por sua mãe, V.L., uma vivenda na praia, de dois andares na cidade de P. na Croácia. O montante pago foi de 450 000 Kunas.

VL tinha um negócio onde vende a retalho e veio a encetar uma relação com Z.L.

A vida veio entretanto a deteriorar-se. Z.L. foi detido por posse de armas proibidas e tentativa de homicídio, V.L. teve problemas de toxico-dependência e SL e JL passaram a ter piores resultados na escola.

ZL foi condenado em pena de seis anos de prisão, tendo sido representado por M.I. um advogado com escritório na cidade de P.

Nos termos do direito croata, para qualquer negócio jurídico ultrapassando os negócios próprios da vida de um menor, deve existir a intervenção, no sentido de fiscalizar a proteção dos interesses dos menores, de um Centro de Segurança Social,.

No contexto de vida descrito, em 2001, M.I. apresentou um pedido ao Centro de Segurança Social, no sentido de as meninas procederem à permuta da sua vivenda com um apartamento no centro da cidade de P. juntando uma procuração assinada pela mãe, pelo padrasto e pelo pai de S.L. A permuta implicava a transferência do direito de propriedade sobre a vivenda para D.M. Em contrapartida, a titularidade do direito de propriedade sobre o apartamento de D.M. no centro da cidade de P. seria transferido para S.L. e J.L.

Além de estar localizada na proximidade da praia, a vivenda objeto da permuta possuía dois andares, cada um de 80m2, enquanto o apartamento era composto por uma única fração com quatro quartos, de uma superfície total de 78m2. Neste quadro seria ainda pago o montante de 100 000 Kunas, enquanto diferença em valor entre a vivenda e o apartamento de D.M. a S.L. e J.L.

D.M. era a sogra de M.I. No Centro de Segurança Social, V.L. alegou a prisão do seu companheiro e as suas dificuldades económicas. O contrato em representação das meninas foi aceite pelo Centro, foi concluído e passou a produzir os seus efeitos.

No decurso do processo civil proposto por S.L. e J.L. representadas pelo padrasto no sentido de obter a anulação deste contrato, veio a saber-se que a vivenda tem um valor mínimo de 300 000 Kunas e que o apartamento apenas valia 70 000. Não existe a certeza que os 100 000 Kunas adicionais prometidos foram pagos, sabe-se que o Centro de S. Social apenas obrigou D.M. a pagar 10 000 Kunas a cada uma das meninas.

Uma ação em primeira instância, recursos e queixas várias, um recurso para o tribunal Constitucional, foram apresentados. Todos com o mesmo resultado da improcedência dos pedidos de S.L. e J.L.

Confrontado em queixa apresentada pelas meninas, o Tribunal Europeu dos Direitos Humanos, não podendo agir como instância de recurso, ou seja, decidir sobre a permuta litigiosa, dando razão a esta ou àquela parte, examinou o comportamento do Centro de Segurança Social. E depois de ter tomado em consideração o direito interno croata e o direito internacional vigente para este Estado, acabou por concluir que o Centro de Segurança Social não teve em conta a posição das crianças. Foi sensível à posição da mãe e do seu companheiro, com dificuldades económicas comprovadas, e problemas de toxico dependência, e em cumprimento de pena, mas não curou do melhor interesse das crianças como lhe impunha a sua posição enquanto instituição de Segurança Social. Nomeadamente, apenas recebeu o depoimento da mãe em desespero, e não foi para o terreno, promover oficiosamente a sua própria investigação. Ainda que, eventualmente, não se pudesse opor à permuta litigiosa (e aqui o TEDH exprime-se com um particular cuidado pois não lhe pertence substituir-se às instâncias nacionais de aplicação da lei), competia ao Centro de Segurança Social velar por que este contrato não fosse tão flagrantemente desequilibrado e que as meninas recebessem um valor patrimonial acrescido da compensação em capital, pelo menos equivalente ao valor da vivenda cuja titularidade era transferida.

Houve assim violação do direito de propriedade, consagrado no artigo 1º do Protocolo n.º 1 à CEDH pelas autoridades Croatas.


Autor: Paulo Marrecas Ferreira