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União Europeia instada a salvaguardar a mobilidade dos migrantes como forma de readquirir o controlo das suas fronteiras

5 fev 2015

“A União Europeia tem de salvaguardar a mobilidade a fim de readquirir o controlo das suas fronteiras”, afirmou hoje o Relator Especial das Nações Unidas sobre os direitos humanos dos migrantes, François Crépeau, na conferência de imprensa que encerrou a sua missão de quatro dias a Bruxelas.

“A situação actual não é sustentável”, avisou o Relator Especial no final desta visita oficial a Bruxelas, terceira e última componente do seu estudo de acompanhamento sobre a gestão das fronteiras externas da União Europeia (UE), lançado em 2012. “Continuando a investir recursos humanos e financeiros sobretudo na segurança das suas fronteiras, a Europa continuará certamente a perder o controlo das mesmas.”

“A aposta na mobilidade significa que o objectivo geral será levar os migrantes a usar os canais oficiais para a entrada e permanência na Europa”, disse. “Para isso, é preciso que os Estados Membros da UE aceitem que os migrantes continuarão a chegar, seja como for, e lhes ofereçam incentivos à utilização de canais regulares, já que estes responderão às suas necessidades, bem como às necessidades económicas e sociais da Europa.”

Os migrantes e requerentes de asilo circulam devido à acção de factores centrífugos nos seus países de origem, que podem incluir a guerra, conflitos, desastres naturais, perseguição ou pobreza extrema, bem como em resposta a factores centrípetos como necessidades não reconhecidas dos mercados de trabalho dos Estados Membros da UE. “É pouco provável que estes factores centrífugos e centrípetos venham a mudar num futuro próximo”, disse o perito. 

Estima-se actualmente que, em 2014, tenham chegado á Europa por via marítima mais de 150000 migrantes e requerentes de asilo, face a 80000 em 2013.

O Relator Especial observou que não se pode esperar, por exemplo, que os sírios permaneçam no Líbano e na Turquia indefinidamente, alguns deles sem qualquer perspectiva viável de uma vida melhor para si próprios ou para as suas famílias, enquanto a UE demora a assumir o compromisso de adoptar um programa significativo de reinstalação de refugiados. “Se nada mais estiver disponível para eles, arriscarão a emigração clandestina para tentar conseguir um futuro melhor para si próprios e para os seus filhos, como muitos de nós fariam em circunstâncias semelhantes”, disse.

“Qualquer tentativa de fechar as fronteiras – conforme os apelos estridentes do discurso nacionalista e populista – continuará a falhar em grande escala”, sublinhou François Crépeau. “É impossível fechar as fronteiras internacionais. Os migrantes continuarão a chegar apesar de todos os esforços para os impedir, com um custo terrível de vidas e sofrimento se mais nada for feito. A Itália reconheceu este facto e lançou a operação de busca e salvamento Mare Nostrum, iniciativa pela qual deve ser felicitada.”

“A Europa está a tentar encontrar a melhor maneira de responder aos movimentos migratórios clandestinos e satisfazer as suas necessidades de imigração apesar de um ambiente político tóxico. Existem sinais de que se está lentamente a mover na direcção certa”, disse, referindo a adopção de várias iniciativas pela UE e pelos governos de alguns dos seus Estados Membros. Estas iniciativas incluem o sistema “Cartão Azul”; a Directiva sobre os Trabalhadores Sazonais; o projecto de política em matéria de ensino e investigação; a proposta de uma abordagem holística aos fenómenos migratórios por parte do Parlamento Europeu; a prioridade atribuída à migração no quadro estratégico e plano de trabalho em prol dos direitos humanos e da democracia promovido pela Alta Representante da UE para os Negócios Estrangeiros e a Política de Segurança e Vice-Presidente da Comissão Europeia, Federica Mogherini; e a operação de busca e salvamento Frontex Triton, que salvou já 17.000 pessoas.

“É preciso que todas estas iniciativas se traduzam em programas eficazes que resultem, quer para os Estados Membros, quer para os migrantes e requerentes de asilo – cujos direitos humanos têm de ser plenamente protegidos em todos os momentos”, disse.

Para evitar que os requerentes de asilo utilizem perigosas rotas terrestres e marítimas, os Estados Europeus, em parceria com outros Estados do Norte Global, devem implementar um importante programa de reinstalação de refugiados, ao longo de vários anos, com uma chave de distribuição para a atribuição de responsabilidades. O Comissário da UE para a Migração, Assuntos Internos e Cidadania, Sr. Avramopoulos, já apelou a uma proposta semelhante e o caminho está a ser aberto com iniciativas como as da Suécia, Alemanha e Áustria.

O perito apelou também a que a Europa não “ignore os factores centrípetos da migração irregular” como as necessidades não reconhecidas de trabalhadores migrantes nos mercados de trabalho clandestinos da Europa. “Os Estados Membros da UE devem reconhecer as suas reais necessidades de trabalho, incluindo de trabalho com baixa remuneração”, observou.

“Isto significa que devem, por um lado, abrir muito mais canais regulares de migração, para trabalhadores com todos os níveis de qualificação. Por outro lado, necessitam de punir os empregadores sem escrúpulos que exploram o receio dos requerentes de asilo e migrantes indocumentados de serem detectados, detidos e deportados”, afirmou o Relator Especial.

“A combinação destas políticas levaria à diminuição dos mercados de trabalho clandestinos, a menos passagens de fronteiras em situação irregular, menos exploração laboral e menos violações dos direitos dos migrantes”, declarou o perito.

“Insto a UE e os Estados Membros da UE a estabelecerem progressivamente uma política migratória coerente e abrangente, que responda a estes problemas e faça da mobilidade a sua característica essencial. Tem de ser desenvolvida uma narrativa comum que celebre a mobilidade e a diversidade, e reconheça as reais necessidades do mercado de trabalho, com base em garantias de direitos humanos e no acesso à justiça, prosseguiu François Crépeau.

Durante a sua visita de quatro dias a Bruxelas, de 2 a 5 de Fevereiro de 2015, o perito independente reuniu com uma série de funcionários europeus responsáveis pela gestão de fronteiras, organizações internacionais e organizações da sociedade civil, a fim de discutir a complexa questão da gestão da fronteira externa da UE, dedicando particular atenção à questão dos migrantes e requerentes de asilo que chegam de barco.

O Relator Especial apresentará um relatório temático sobre a gestão das fronteiras da UE ao Conselho de Direitos Humanos das Nações Unidas, em Junho de 2015.


Autor: Raquel Tavares

Fontewww.ohchr.org